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A perspectiva do período Bolsonaro é de caos e total desgoverno

Postado às 07h50 | 13 Jan 2019

João Paulo Jales dos Santos. Estudante do curso de Ciências Sociais da UERN.

Até aqui, com pouco mais de 10 dias de governo, a entourage de Jair Bolsonaro vem produzindo aquilo que já era esperado, uma colossal incompetência. Esperado, porque, ao olhar com atenção os quadros da equipe do governo, os nomes escolhidos não possuíam experiência em administração pública, além da total falta de traquejo no jogo político. Se foi fácil vencer as eleições, não será fácil governar, nem muito menos, ser governo, que arca com responsabilidades e cobranças de melhoria de vida.

Já que a extrema direita brasileira adora cumprir um papel servil perante os Estados Unidos, façamos uma comparação com a chegada de Donald Trump à presidência, com o momento que Bolsonaro assume o comando do Palácio do Planalto. Trump assumiu com uma economia equilibrada, fruto das políticas do governo de Barack Obama, bem como de uma consequente recuperação depois do tombo econômico da crise de 2007/2008. Jair Bolsonaro, assume num cenário bem diferente.

O Brasil está com um alto índice de desemprego, com seguidos défices nas contas públicas, uma economia com uma recuperação lenta, e sem uma perspectiva imediata de melhora nas finanças dos lares das famílias. Um cenário complicado que a equipe bolsonarista não está à altura para enfrentar. De todo modo, convém aguardar os próximos meses. Se se seguir o ritmo de descalabro político-administrativo que ocorreu nesses primeiros dias de governo, será até mesmo difícil para Bolsonaro encerrar seu mandato.

Não se trata somente de inaptidão técnico-administrativo da equipe do governo. Se trata também, da total incapacidade política de Jair Bolsonaro. Que não é de modo algum um líder. Característica fundamental para fazer um bom governo.

E um contraponto ao que muitos dizem, se não é líder, Bolsonaro tão pouco é nacionalista, no sentido técnico e real do termo. Bolsonaro é entusiasta dos símbolos patrióticos, que não faz ninguém ser automaticamente nacionalista.  

O bolsonarismo foi uma onda que por motivos diversos e atípicos levou Bolsonaro à presidência. Mas, se for tratar o bolsonarismo como um movimento político com capacidade de se manter coeso e firme sob a liderança de Bolsonaro, a história já é outra.

A palavra de ordem para Bolsonaro é ideologia. Faz sentido, se se olhar pela perspectiva da extrema direita. A ideologia bolsonarista, não entendida como princípio de um conjunto de ideias que orientam ações e valores políticos e sociais, mas como uma farsa alienatória para práticas e ideias que não condizem com a realidade objetiva, é instrumento essencial para que o presidente mantenha popularidade enquanto o governo conseguir ir se safando da baixa na popularidade que tende a vir daqui a alguns meses.

Mentiras em massa, foram imprescindíveis para derrotar os adversários, mas, se não aparecer emprego, renda e consumo, manter os bolsos e os estômagos dos trabalhadores brasileiros com ideologia, não irá sustentar a favorabilidade do presidente adiante. É entendível os bons índices de aprovação que Bolsonaro goza nesse início de mandato, isso é fato comum para presidentes que acabaram de se eleger ou reeleger.

As mudanças em previdência, economia e em políticas sociais que a extrema direita quer fazer no Brasil, como já mensuraram inúmeras pesquisas, não contam com grande aprovação popular.

A proposta do governo para a previdência, vai de encontro com os desejos da população. Se por enquanto as massas estão dispostas a aceitarem algum grau de reformas liberalizantes, elas não estão dispostas a aceitarem em altas doses, ainda mais levando-se em conta a áurea patrimonialista e assistencialista tão presentes no seio da sociedade brasileira.

A previdência é uma questão de forte sensibilidade social, que mexe com os sentimentos populares, porque só de ouvirem falar em reforma, a classe baixa e a trabalhista, e em menor grau, a classe média, ficam nervosas e apreensivas. A proposta previdenciária do governo atende os anseios máximos dos quadros ultraconservadores que dão sustentação a Bolsonaro.

No entanto, é preciso lembrar, que a proposta passará por um grande balcão que se chama Congresso Nacional. Um balcão de patronagem e de negociação. Uma proposta previdenciária ultraliberalizante, atende aos requisitos do PSL e dos partidos fundamentalistas religiosos que estão estreitamente vinculados ao projeto neoliberal, mas, não atende aos requisitos da oposição, e de muitos congressistas de centro-direita. Negociações fazem parte do cotidiano legislativo-parlamentar.

Os vários atores não envolvidos com a proposta previdenciária de Paulo Guedes e do mercado, irão ponderar e moderar bastante a proposta de capitalização, podendo esta nem ao menos sequer ser aprovada pelo Congresso, e tendo que ser dada como morta ao longo das discussões que passará nas comissões temáticas da Câmara e do Senado.

Essa proposição previdenciária, que muda radicalmente os propósitos constitucionais da Previdência Social, não terá o agrado nem da oposição, nem do considerável número de deputados pragmáticos e de centro-direita que sobreviveram a onda ‘anti-política’.

Nomes como Renan Calheiros, Jader Barbalho, entendem como ninguém os ritos técnico-processuais que uma legislação perpassa, e sabem que uma questão tão socialmente sensivelmente como é a previdência, precisa ser reformada dentro da ordem política e institucional que perdura há 30 anos no país. Desde a CF de 1988, as reformas são feitas gradualmente, sem sobressaltos.

É nesta ordem, que mesmo enfraquecida após os resultados da última eleição, que terá que se enquadrar a Previdência Social proposta pelo governo.

Se a esquerda, e a centro-direita, ficaram assustadas com a ascensão meteórica de Jair Bolsonaro, deveriam parar para refletir de que entre tantos motivos, o desmonte do Estado de Bem-estar Social proposta pela CF de 1988, tem enorme peso para a fúria que elegeu Bolsonaro. O Brasil, na prática, tem um modelo de Estado que em vez de ser um modelador para oportunidades sociais iguais, acaba por ser um grande gerador de desigualdade. Os modelos públicos universais de educação e saúde falharam retumbantemente.

A mobilidade social é precária e escassa. O Estado de Bem-estar Social brasileiro, que nunca foi aquilo que para tanto foi planejado, acabou por incentivar a fuga da classe média para as instituições privadas de educação e fazerem uso de planos privativos de saúde, além de entregar para as classes populares, serviços de baixíssima qualidade.

Em um país de regime tributário regressivo, onde recai sob o consumo a maior carga tributária, com ricos pagando níveis baixíssimos de impostos, e isso quando ainda pagam algum tributo, e as massas enxergando que o público é sinônimo de ineficiência, o Estado de seguridade social falhou, aliado a uma profunda crise de criminalidade, e acabou por canalizar a irritação do brasileiro, que se vendo traído por suas elites tradicionais, preferiu votar em que se diz “contra tudo que está aí”.

Os establishments de esquerda e direita, possuem responsabilidade pelo arruinamento de um modelo de Estado que acabou gerando mais desigualdade e instabilidade econômica. O ponto positivo para a esquerda e a direta tradicional, é que apesar da primeira estar dividida em si mesma, e a segunda zonza, e, portanto, sem rumo, com a rasteira que tomou de Bolsonaro, ambas podem se alegrar com o fato de que Bolsonaro e seu entorno são tão inaptos, que não precisam de oposição.

O 1% mais rico do país quer levar à cabo um projeto econômico ultraliberal. Mas se olhar com cuidado para a Índia, país que é onde está acontecendo uma profunda reforma liberal dando uma guinada ao neoliberalismo, numa sociedade tão caótica como a indiana, o establishment endinheirado, perceberá que mesmo numa sociedade passiva como a brasileira, a implementação de um radical projeto neoliberal, não será tarefa fácil.

Bolsonaro tende a governar dentro dos freios e contrapesos. No entanto, há que se aguardar que rumo tomará seu governo. Se chegar a um nível de total desgoverno, o que se é esperado, um impeachment do presidente pode se tornar a única e viável alternativa.

Mas não será fácil depor um presidente que tem o apoio irrestrito de cerca de 25% da população, a base social que forma o núcleo duro bolsonarista, que está sempre ativamente engajada na defesa intransigente a Bolsonaro. O risco é que se a extrema direita produzir aquilo que se imagina, o caos administrativo, político e econômico, o establishment político, que mesmo derrotado nas urnas ainda dá as cartas, fique num labirinto, onde uma proposta de uma nova constituinte possa vir à tona.

Mas, uma nova constituição, não é objeto de desejo da imensa parcela da classe política tradicional, que prefere não mexer, ao menos por ora, no ordenamento jurídico advindo da CF/88.

É aguardar julho, porque a partir do segundo semestre do ano, já se terá uma melhor resposta credível de como anda o termômetro de aprovação do governo perante a opinião pública. No próximo ano, haverá eleições municipais, e caso a oposição, formada basicamente pela esquerda, triunfe nas urnas, isso já é um sintoma do que poderá vir a acontecer na presidencial de 2022.

O PSDB e a centro-direita, não darão vida fácil por muito tempo a Bolsonaro, no momento oportuno, irão com tudo contra o presidente, para retomar o protagonismo na direita brasileira. Para a esquerda, resta se organizar e se articular melhor. As ideias sociais e trabalhistas defendidas pelo campo esquerdista, tem forte respaldo na população, se souberem lidar com essas temáticas junto a classe baixa e a classe média baixa e intermediária, poderá ganhar terreno político, caso Bolsonaro e a elite neoliberal, venham a confirmar as tendências, e caíam em profunda desgraça política.

Se nesses poucos dias de governo, as trapalhadas foram homéricas, dá para alguém pensar que por parte de Bolsonaro e dos hoje despolitizados militares, haja risco de golpe? A resposta, é aquele sonoro não. 

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