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Análise: "Peru, no “fio da navalha”

Postado às 06h23 | 07 Jun 2021

Ney Lopes

Realizou-se ontem, 6, no Peru, o segundo turno das eleições mais complexas e confusas da América Latina nos últimos anos.

Nas primeiras horas desta segunda, 7, todas as pesquisas de “boca de urna” mostravam empate técnico, com mínima tendência para Keiko Fujimori.

Espera-se o resultado nas próxima horas (ou dias) para ser conhecido o destino de um país histórico e que enfrenta, no momento, seríssima crise política e sanitária, sem precedentes.

Os dois candidatos - Keiko Fujimori e Pedro Castillo – têm perfis diferentes.

Candidata pela terceira vez, Keiko é velha conhecida dos peruanos, tanto por sua própria trajetória - ela chegou a ser detida sob acusação de ter recebido US$ 1,2 milhão irregularmente da empreiteira brasileira Odebrecht no Peru - como pelo fato de ser filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), atualmente preso por abusos de direitos humanos.

Keiko defende a manutenção das regras econômicas atuais, como o livre comércio e medidas que facilitem os investimentos externos, incluindo a mineração, um dos alvos nos planos de nacionalização de seu opositor - a quem ela costuma se referir como representante do "comunismo”.

Quando criticada pelos erros na gestão de seu pai, que foi condenado em 2009 como autor intelectual de matanças que deixaram 25 vítimas no país - ela costuma responder que 20 anos se passaram, pediu desculpas e responsabiliza os governos que o sucederam pelas crises em curso no país andino.

Pedro Castillo é interpretado como "estatizante" no âmbito econômico e conservador no social.

Ele costuma dizer que quer o "Estado na vida das pessoas" e termina discursos  com a sua emblemática “palavra de maestro" ('palavra de professor').

O Peru é um dos países com maiores índices de católicos na América Latina.

Castillo rejeita a comunidade gay, mas passou a contar com o apoio da emblemática política de esquerda no país.

A única coincidência entre Keiko e Castillo é que os dois só reconhecem dois sexos, homem e mulher.

Keiko fez uma campanha com propostas mais concretas para diferentes setores e falou muito às mulheres.

Castillo cometeu erros, como as declarações machistas sobre o feminicídio, e propostas que mostraram inconsistência.

Mas, ele tem o apoio dos eleitores que são das regiões rurais e mesmo morando na capital mantêm a cultura popular andina.

A eleição se realizou depois do governo ter reconhecido que o número de óbitos por covid-19 é mais que o dobro do que os 70 mil que haviam informado anteriormente.

Trata-se da mais alta taxa do mundo em mortes a cada milhão de habitantes.

Os analistas políticos latino-americanos observam que o Peru já teve eleições muito disputadas no passado, mas nenhuma com candidatos "tão extremamente diferentes".

O grande temor é a volta do grupo terrorista “Sendero Luminoso”, um dos alvos principais das políticas do fujimorismo na década de 1990 e que no mês passado deixou 14 mortos num ataque em plena via pública do país.

Com a apuração dos votos em marcha, tudo é incógnita em relação ao futuro do Peru.

Não se pode prever quem ganhará a eleição de ontem, 6, como também permanece a absoluta “imprevisibilidade” sobre qual será o comportamento do vitorioso, no exercício do poder.

O escritor peruano Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura, que já foi opositor de Fujimori, resolveu apoiar a sua filha nesta eleição e justificou: “

“Muitos de nós, peruanos, decidimos votar em Keiko Fujimori.

Ela se desculpou publicamente por seus erros do passado e ampliou consideravelmente sua equipe de governo, incorporando antifujimoristas convictos e declarados e se comprometendo a respeitar a liberdade de expressão, o Poder Judiciário e a entrega do poder após cinco anos, conforme estabelecido pela Constituição”.

Na verdade, o Peru está no fio da navalha!

Só resta aguardar!

 

 

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