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Incerteza nas eleições americanas pode mudar política externa brasileira

Postado às 06h51 | 14 Jul 2020

O Palácio do Planalto acompanha com preocupação o desempenho do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nas pesquisas de opinião para as eleições de novembro. As indicações de que o democrata Joe Biden poderá vencer a disputa levaram o governo brasileiro a admitir mudanças na política externa, alinhada com conservadorismo de Trump desde a posse do presidente Jair Bolsonaro. Segundo fontes do meio diplomático, esse cenário reforçou discussões internas sobre a conveniência de se manter o embaixador Ernesto Araújo, um entusiasta do magnata republicano, à frente do Ministério das Relações Exteriores (MRE).

A possível saída de Araújo do cargo vinha sendo cogitada pelo Planalto em razão do crescente isolamento do Brasil na comunidade internacional. Agora, ante a possibilidade de vitória de Biden nas urnas, auxiliares de Bolsonaro têm alertado para a necessidade de emitir um gesto em direção ao democrata. A permanência de Araújo no comando do Itamaraty é vista como um obstáculo à reaproximação.

O presidente, que já criticou o Partido Democrata e disse que “se Deus Quiser Trump será reeleito”, tem  seguido o americano em diferentes campos. Recentemente, Trump anunciou a saída do seu país da Organização Mundial da Saúde (OMS), a qual acusou de atuar em favor da China durante a pandemia do novo coronavírus. Com o mesmo argumento, Bolsonaro ameaçou acompanhá-lo. Já Biden, após o anúncio de Trump, afirmou que, se ele for eleito, os EUA voltariam à OMS no primeiro dia de governo.

Dez pontos

As pesquisas de intenção de voto nos EUA colocam Biden com mais de dez pontos à frente de Trump. O republicano tem perdido prestígio junto aos eleitores, devido a sua atuação durante a pandemia. O país é recordista no número de infectados (cerca de 3,3 milhões de casos) e de mortos (aproximadamente 135 mil) por covid-19, segundo balanço de ontem  da Universidade Johns Hopkins.

“Sempre que um presidente em exercício busca reeleição, a eleição é em grande parte um referendo sobre o titular. A maioria dos americanos não quer mais quatro anos de Trump”, disse ao Correio o cientista político Lincoln Mitchell, professor da Universidade Columbia, de Nova Iorque.

“Em janeiro, as pesquisas de intenção de voto ficaram empatadas, por que muitos americanos aprovaram a economia e o racismo de Trump, enquanto outros se opuseram a ele por suas políticas de fanatismo e de direita. No entanto, seu péssimo comportamento durante a pandemia levou a maioria dos americanos a acreditar que é hora de mudar. Se a eleição fosse hoje, Biden venceria”, acrescentou Mitchell.
Para Günther Richter Mros, professor de Relações Internacionais da Universidade de Santa Maria (UFSM), com uma eventual eleição de Biden, as relações entre Brasil e EUA poderão ser caracterizadas, de partida, sob dois pontos distintos, porém não excludentes.

“Biden poderá ligar a figura de Bolsonaro ao trumpismo e, nesse sentido, cobrar com maior veemência débitos internacionais do Brasil, dos quais o desmatamento da Amazônia seria neste momento o mais evidente”, disse o Mros.

“Mas, no alto nível, nas relações de Estado, Biden não pode descartar o Brasil de sua política externa, sob pena de dar à China a oportunidade de maior aproximação com o Brasil, mesmo que isso pudesse ser, na atual conjuntura ideológica, algo impensável. Ocorre, entretanto, que a China é a maior parceira do Brasil e o dinheiro, mais cedo ou mais tarde, costuma ser bem pragmático”, acrescentou o professor.

Ele ponderou, entretanto, que os americanos sabem ser pragmáticos, e Biden, de olho na China, não colocará o Brasil na “geladeira” por causa da relação Trump-Bolsonaro.

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