Postado às 09h16 | 05 Set 2019
João Paulo Jales dos Santos. Estudante do curso de Ciências Sociais da UERN.
A morte de Wilma Maria de Faria em junho de 2017 marcou o falecimento de uma das políticas que na primeira década do século XXI imprimiu uma forte marca política no Rio Grande do Norte.
A alcunha de ‘Guerreira’, artificio de marketing político-eleitoral para nomear mulheres imprimindo-lhes uma característica de fortaleza para fazer contraponto a ideia popular de fragilidade feminina, caiu bem na trajetória de Wilma. Ainda adotou o V em lugar do W nas campanhas, como uma estratégia.
No início da década de 80 saiu da condição de ser conhecida como esposa de Lavoisier Maia para ganhar marca política e social própria. Atuando na coordenação de programas sociais nos governos de Lavoisier e José Agripino, foi montando sua base social que pouco tempo depois se transformaria em base sócio-política-eleitoral. Foi a partir do trabalho exercido na coordenação de relevantes programas sociais no estado e em Natal que projetou seu nome no cenário político.
Em 1985, apoiada por José Agripino, disputa a primeira eleição direta para à Prefeitura de Natal com o início da abertura a redemocratização, onde sofre um revés e perde para Garibaldi, em meio ao lastro do denominado escândalo ‘rabo de palha’, que às vésperas da eleição ganha amplitude nacional.
No ano seguinte, já começando a percorrer em faixa própria, se elege deputada federal sendo a mais votada daquele pleito, tendo atuação relevante na proposta de elaboração da constituição de 1988.
Em 1988, já no PDT, é eleita prefeita de Natal, fazendo seu sucessor 4 anos, Aldo Tinoco. Em 1992, contrariando as expectativas de vitória de Henrique Eduardo Alves, Wilma mobiliza sua base e consegue reverter a derrota de Tinoco no 1º turno.
Em 1994, já no PSB, partido onde marcaria sua trajetória política tendo se desfiliado em 2016, passando 22 anos vinculada a sigla, é candidata ao governo do estado. Mas a empreitada ao governo é um fracasso, obtendo pouco menos de 4% dos votos válidos. Em 1996, se posicionando contra o desgastado governo de Tinoco, seu outrora ‘filho’ político, lança sua 3ª candidatura à Prefeitura de Natal.
Voltando a contar com o apoio de Agripino, tentando se desvincular da negativa imagem administrativa de Aldo Tinoco, vence Fátima Bezerra num 2º turno disputado. Fátima que Wilma enfrentaria ainda em 2000, quando foi reeleita com facilidade prefeita de Natal, e em 2014, quando já bastante desgastada, vê Fátima ser eleita senadora com uma maioria de quase 12% dos votos válidos.
Em 2000, disputou a Prefeitura com o apoio dos Alves, já estando rompida com Agripino. Em 2002, numa decisão arriscada se lança candidata ao governo do estado.
Numa chapa formada por seu PSB e 2 outros partidos de baixa inexpressão no quadro político-partidário, faz uma campanha meteórica, atropelando os favoritos na disputa, Fernando Freire e Fernando Bezerra, ainda no 1º turno.
Passeia fácil no 2º turno e vence Fernando Freire com uma diferença de 22,10% dos votos. Se firmava ali de vez em 2002, naquela disputa para o governo do estado, a marca política de ‘Guerreira’.
Em 2004, na eleição para Prefeitura da capital, antecipa o embate político que enfrentaria na sua reeleição ao governo do estado 2 anos depois. Consegue reeleger Carlos Eduardo numa disputa ferrenha contra Luiz Almir, que no 2º turno reuniu em torno de si o apoio dos adversários históricos, Maia e Alves.
Na tentativa de reeleição, em 2006, começa a campanha em franca desvantagem contra Garibaldi Alves, que enfrentara em 2 momentos, em 1985, num embate mais direto, e em 1994, num embate menos direto. Faz uma campanha onde a alcunha de ‘Guerreira’ mais uma vez se confirma, e nas 2 últimas semanas de campanha para encerrar o 1º turno, com o poderio da máquina administrativa estadual, usando a gestão dos programas sociais como vitrine de governo, o carisma popular de líder política, e com o crucial apoio de Lula, se recupera e começa a ascender na eleição.
No 1º turno, acaba com uma leve dianteira sobre Garibaldi, ampliando um pouco a margem e sendo vitoriosa com 52,38% dos votos válidos.
Ali em 2006, começam fatores que ao longo do 2º mandato de Wilma, juntamente com a imagem negativa advinda dos vários escândalos de corrupção, afunda a popularidade da governadora. Wilma é reeleita com 8,67% a menos de votos quando se compara com sua eleição em 2002.
Neste ano, ainda desconhecida de boa parte do eleitorado potiguar, enfrenta um adversário não tão competitivo como foi Garibaldi em 2006, motivos que explicam sua fácil vitória no 2º turno em sua 1ª vitória para o governo estadual.
Se em 2002 vence fácil nos 3 maiores colégios eleitorais do estado, em 2006 perde em Mossoró e Parnamirim, e vence em Natal com margem estreita. Se a vitória de Wilma em 2002 havia sido puxada com a votação das cidades mais populosas em conjunto com o interior do estado, em 2006 ocorre uma modificação nesse quadro, Wilma é reeleita com a força dos votos do interior, sofrendo revés em 4 dos 5 maiores colégios eleitorais do estado.
A perda de apoio nas principais cidades em 2006, que se acentuou ao longo do mandato, com a diminuição dos índices de avaliação da gestão e em torno de sua imagem política, e o apoio que perdera até mesmo no interior, que lhe garantiu a vitória sobre Garibaldi, foram fatores cruciais para em 2010 Wilma perder a eleição ao Senado Federal, quando enfrentou em disputa direta os pesos pesados Agripino e Garibaldi.
Se os 2 senadores à época só viriam a sofrer o desgaste e a consequente derrota no pleito de 2018, quando as lideranças tradicionais da política a nível nacional viram seu capital político-eleitoral diminuir substancialmente, a derrocada de Wilma se deu num cenário onde as lideranças tradicionais ainda gozavam de crédito com a população. Wilma, junto com Garibaldi e Agripino, dividiu a influencia na política potiguar nos primeiros 10 anos dos anos 2000.
Em 2012, aceita ser vice de Carlos Eduardo, numa chapa forte que fazendo oposição a Rosalba Ciarlini, que tinha alta reprovação na capital, é eleita com facilidade. Até aqui, 2019, foi o governo de Wilma o último governo que mais obras fez em Mossoró, mesmo a cidade não sendo seu reduto eleitoral, e tendo contado quando foi governadora à época, profunda rejeição por parte do ‘rosalbismo’.
Em 2014, sem nenhum comedimento, se lança ao Senado, na pré-campanha liderava as pesquisas, mas nunca com uma ampla margem em relação a Fátima Bezerra, e perdendo o pleito na impopularidade do ‘chapão’ formado em torno da candidatura de Henrique Eduardo ao governo.
Nas 2 ocasiões, em 2010 e 2014, em que disputou o Senado, Wilma recebeu de alguns auxiliares próximos que temiam pelo legado de sua carreira política, a indicação de que melhor seria disputar uma vaga a Câmara Federal, diagnostico já baseado no desgaste político que sofria.
Disputando uma cadeira a Câmara, Wilma tendia a ser eleita, e assim poderia se resguardar politicamente e depois ter a possibilidade de almejar algum cargo majoritário numa próxima eleição.
Não ouviu os auxiliares e por conta e risco, com a pressão de sua base política, decidiu ser candidata ao Senado, perdendo as 2 eleições por um profundo desgaste eleitoral em torno de sua figura.
Já debilitada politicamente, aceita lançar candidatura a vereança em 2016 por Natal. Na pré-campanha, havia a expectativa de tirar uns 30 mil votos das urnas, mas o resultado foi o contrário, sendo eleita vereadora com 4421 votos, sendo a 14ª mais votada dos vereadores eleitos.
Com um quadro clinico já delicado, passou boa parte da campanha em tratamento contra o câncer que lhe acometera. A trajetória da carreira de Wilma é uma das que mais se sobressai na história da política potiguar. Wilma ascendeu nas estruturas eleitorais a partir da força da tradição, sendo esposa de Lavoisier, e aliada de primeira hora, na década de 80, de José Agripino.
Mas conseguiu manter-se viva na política, construindo sua própria faixa eleitoral, quando não mais era aliada dos Maias. Foram os governos de Wilma, juntamente com o pouco tempo de mandato de Iberê Ferreira, os últimos governos a pagarem em dia o salário do funcionalismo público.
Alguns nomes da política do estado devem a Wilma a oportunidade de maior projeção que tiveram, pois foi nos mandatos no executivo como prefeita e governadora que nomes como Carlos Eduardo Alves, João Maia e Rogério Marinho obtiveram apoio político e puderam alçar maior projeção, construindo assim suas próprias carreiras eleitorais.
Uma pesquisa do IBOPE em parceria com a Tribuna do Norte no ano passado, constatou que Wilma foi eleita a melhor governadora dos últimos 30 anos. Certamente a lembrança de que seu governo e de seu vice, Iberê, foi o último a pagar em dia o funcionalismo público, contribuiu e muito para que Wilma fosse alçada a preferida do povo potiguar.
A economia do Brasil no momento em que Wilma governou o estado não se compara com a economia que definhou no país a partir do ano de 2015, mas a lembrança é de que Wilma conseguia pôr em dia a folha salarial dos ativos, aposentados e pensionistas. A ‘Guerreira’ teve um fim de carreira política que nada se compara com a sua trajetória política. De 2009 até a sua morte em 2017, sua imagem foi fortemente abalada perante a opinião pública, das eleições que disputou nesse interim de tempo, venceu aquelas tidas como menos importantes, para a vice-prefeitura de Natal e a vereança da capital.
Depois de um fim político que em nenhuma escala se compara com a envergadura de sua trajetória como líder política, a pesquisa IBOPE/Tribuna do Norte é um alivio de reconhecimento para aquela que foi uma das maiores lideranças políticas do estado na era moderna, Wilma Maria de Faria.